Devo confessar uma coisa a respeito de O Diabo Veste Prada, de David Frankel: fui ao cinema esperando que fosse um bom filme. Muitos (certamente menos ingênuos) ririam dessa minha esperança, mas eu estava bastante curiosa em relação ao desenrolar do tema: o título já me pareceu intrigante... Não li (e nem conhecia) o livro, portanto não posso comentar o filme como adaptação – e talvez seja essa a causa das minhas frustradas expectativas. Ouvi alguns dizerem que é uma obra para os amantes de moda... É, deve ser, mesmo. Aliás, se a moda aqui é tratada de maneira digna, não quero nem pensar o que seria dela se fosse vulgarizada!
É bem verdade que nem tudo é uma porcaria: a atuação de Meryl Streep é, como sempre, impecável: ela está excelente tanto como vilã quanto, posteriormente, como anti-heroína – sim, porque há no desenrolar da narrativa uma mudança gradativa em relação à visão que se transmite dessa personagem, humanização essa que me incomodou um tanto e para esse assunto voltarei em breve. A trilha sonora e os figurinos (também, era só o que faltava, o filme tem o mundo da moda como cenário...) não são de se jogar fora. O problema é: um filme que se prende apenas por atuações, figurinos e trilha sonora não pode ser levado muito a sério. Que ele não seja inovador, tudo bem (essa fixação por originalidade também me irrita), mas daí a ser "clichezão" tem uma enorme diferença. Um roteiro básico e previsível, uma direção medíocre e uma fotografia comum marcam essa comédia tipicamente hollywoodiana.
Anne Hathaway faz o papel de Andrea, uma jovem inteligente e talentosa que, recém-formada em jornalismo, muda-se para Nova York na tentativa de lutar por sua tão sonhada carreira. Em vez de um grande jornal, no entanto, a única coisa que ela consegue é trabalhar como segunda assistente da editora-chefe de uma das maiores revistas de moda dos Estados Unidos: a Runaway. O emprego que seria o dos sonhos de muitas garotas, inicialmente desprezado por ela – esse seria o motivo, a propósito, dela tê-lo conseguido – vai, ao longo dos meses, transformando a nossa protagonista. Andrea é apresentada de maneira óbvia, porém interessante: enquanto suas concorrentes escolhem a dedo a roupa, a maquiagem e os acessórios que vão utilizar para serem entrevistadas pela rainha da moda e pegam táxis para chegar à revista, a nossa excepcional moça veste a primeira roupa que encontra no armário e, como se não bastasse, ainda come com gosto e sem culpa um pão com recheio de cebola numa padaria próxima à saída do metrô – um verdadeiro insulto para as modelos: muito carboidrato! Pronto: a única diferente, a única capaz. Sua idéia é agüentar o emprego (com todas as suas futilidades e, o pior, as grosserias da chefe) como se fosse um trampolim para algo realmente importante e digno durante apenas um ano no intuito de conseguir um bom QI (“quem indique”). É até engraçado (e, devo dizer, um tanto inverossímil) o quanto Andrea é ridicularizada por todos por ser gorda (manequim 40): a atriz que a interpreta é magérrima!!! Entendo o sarcasmo na escolha de Hathaway para o papel, mas para isso funcionar, as outras garotas deveriam ser mais magras do que ela... A primeira assistente, por exemplo. Enfim, deixa isso pra lá; a minha grande questão aqui nem é essa.
A virada do filme vem com o drama moral que surgirá quando Andrea começa a gostar do mundo de aparências e glamour que a rodeia. Desculpem-me aqueles que ainda não assistiram ao filme e nem imaginam o final, terei de surpreendê-los: Andrea não se deixa seduzir por completo pelas futilidades, oh, que grande mocinha! Quando percebe que o seu futuro é tornar-se uma canalha solitária porém glamurosa e famosa como a editora, quando se dá conta de que as duas possuíam tanto em comum, abandona a sua “diabólica” chefe – que, nessas alturas, já ganhou a simpatia do espectador e, de tão humanizada, já não é mais tão diabólica assim... – Miranda Priesley. Nenhum problema com o moralismo em si, mas, para funcionar de forma eficaz, ele deveria ser coerente. A vilã, de tão humanizada – como já comentei anteriormente – acaba se tornando uma anti-heroína e, para que esse efeito seja alcançado, o filme acaba banalizando algo que para tantos é realmente normal: viver para trabalhar, viver com o único intuito de manter o sistema. Que problema, porém, há nisso, não é mesmo? O trabalho dignifica o homem...
Um questionamento, porém, é bastante verdadeiro: no momento em que Andrea começa a vender a alma para o diabo, defende a chefe durante um diálogo com o seu futuro amante ao comentar que, se Miranda fosse um homem, todos admirariam o seu trabalho. O pior é que é verdade! Mas isso não isenta a personagem de Streep de sua falta de moral, muito pelo contrário, somente mostra o quanto determinados valores não importam nesse nosso mundinho etnocêntrico ocidental. A humanização de Miranda, particularmente, incomodou-me, porque em vez de transformá-la numa personagem complexa, serviu apenas para demonstrar o quanto a visão das pessoas no geral sobre o trabalho é a mesma de Miranda. Na realidade, a grande maioria não apenas se identifica com ela, também a admira e a inveja...
Lembrei-me, ao assistir a essa comédia de Frankel, de um drama chamado O preço da ambição ("Swimming with sharks", George Huang, 1994), já que os dois filmes trabalham com o mesmo tema. No último, o protagonista é um profissional recém-formado em cinema que deseja conseguir uma grande oportunidade de emprego e, em nome disso, se sujeita a ser assistente de uma grande “celebridade”: um famosíssimo produtor hollywoodiano que humilha a todos por considerar-se superior. Semelhantes, não? No caso deste último filme, porém, Kevin Spacey interpreta brilhantemente o produtor que, ao contrário de Miranda, consegue se tornar uma personagem complexa no desenvolver da trama. Parece-me o mesmo tema, no entanto, aqui é tratado de maneira séria (não porque é um drama em vez de comédia, e sim por ser bem feito) e respeitável.
É... Chego à conclusão de que O Diabo Veste Prada é um bom entretenimento para aqueles que se deixam seduzir pelo mundo da moda e das aparências, com direito até (que beleza!!!) a um happy end daqueles e, por mais incrível que possa parecer, um final moralizante.
É bem verdade que nem tudo é uma porcaria: a atuação de Meryl Streep é, como sempre, impecável: ela está excelente tanto como vilã quanto, posteriormente, como anti-heroína – sim, porque há no desenrolar da narrativa uma mudança gradativa em relação à visão que se transmite dessa personagem, humanização essa que me incomodou um tanto e para esse assunto voltarei em breve. A trilha sonora e os figurinos (também, era só o que faltava, o filme tem o mundo da moda como cenário...) não são de se jogar fora. O problema é: um filme que se prende apenas por atuações, figurinos e trilha sonora não pode ser levado muito a sério. Que ele não seja inovador, tudo bem (essa fixação por originalidade também me irrita), mas daí a ser "clichezão" tem uma enorme diferença. Um roteiro básico e previsível, uma direção medíocre e uma fotografia comum marcam essa comédia tipicamente hollywoodiana.
Anne Hathaway faz o papel de Andrea, uma jovem inteligente e talentosa que, recém-formada em jornalismo, muda-se para Nova York na tentativa de lutar por sua tão sonhada carreira. Em vez de um grande jornal, no entanto, a única coisa que ela consegue é trabalhar como segunda assistente da editora-chefe de uma das maiores revistas de moda dos Estados Unidos: a Runaway. O emprego que seria o dos sonhos de muitas garotas, inicialmente desprezado por ela – esse seria o motivo, a propósito, dela tê-lo conseguido – vai, ao longo dos meses, transformando a nossa protagonista. Andrea é apresentada de maneira óbvia, porém interessante: enquanto suas concorrentes escolhem a dedo a roupa, a maquiagem e os acessórios que vão utilizar para serem entrevistadas pela rainha da moda e pegam táxis para chegar à revista, a nossa excepcional moça veste a primeira roupa que encontra no armário e, como se não bastasse, ainda come com gosto e sem culpa um pão com recheio de cebola numa padaria próxima à saída do metrô – um verdadeiro insulto para as modelos: muito carboidrato! Pronto: a única diferente, a única capaz. Sua idéia é agüentar o emprego (com todas as suas futilidades e, o pior, as grosserias da chefe) como se fosse um trampolim para algo realmente importante e digno durante apenas um ano no intuito de conseguir um bom QI (“quem indique”). É até engraçado (e, devo dizer, um tanto inverossímil) o quanto Andrea é ridicularizada por todos por ser gorda (manequim 40): a atriz que a interpreta é magérrima!!! Entendo o sarcasmo na escolha de Hathaway para o papel, mas para isso funcionar, as outras garotas deveriam ser mais magras do que ela... A primeira assistente, por exemplo. Enfim, deixa isso pra lá; a minha grande questão aqui nem é essa.
A virada do filme vem com o drama moral que surgirá quando Andrea começa a gostar do mundo de aparências e glamour que a rodeia. Desculpem-me aqueles que ainda não assistiram ao filme e nem imaginam o final, terei de surpreendê-los: Andrea não se deixa seduzir por completo pelas futilidades, oh, que grande mocinha! Quando percebe que o seu futuro é tornar-se uma canalha solitária porém glamurosa e famosa como a editora, quando se dá conta de que as duas possuíam tanto em comum, abandona a sua “diabólica” chefe – que, nessas alturas, já ganhou a simpatia do espectador e, de tão humanizada, já não é mais tão diabólica assim... – Miranda Priesley. Nenhum problema com o moralismo em si, mas, para funcionar de forma eficaz, ele deveria ser coerente. A vilã, de tão humanizada – como já comentei anteriormente – acaba se tornando uma anti-heroína e, para que esse efeito seja alcançado, o filme acaba banalizando algo que para tantos é realmente normal: viver para trabalhar, viver com o único intuito de manter o sistema. Que problema, porém, há nisso, não é mesmo? O trabalho dignifica o homem...
Um questionamento, porém, é bastante verdadeiro: no momento em que Andrea começa a vender a alma para o diabo, defende a chefe durante um diálogo com o seu futuro amante ao comentar que, se Miranda fosse um homem, todos admirariam o seu trabalho. O pior é que é verdade! Mas isso não isenta a personagem de Streep de sua falta de moral, muito pelo contrário, somente mostra o quanto determinados valores não importam nesse nosso mundinho etnocêntrico ocidental. A humanização de Miranda, particularmente, incomodou-me, porque em vez de transformá-la numa personagem complexa, serviu apenas para demonstrar o quanto a visão das pessoas no geral sobre o trabalho é a mesma de Miranda. Na realidade, a grande maioria não apenas se identifica com ela, também a admira e a inveja...
Lembrei-me, ao assistir a essa comédia de Frankel, de um drama chamado O preço da ambição ("Swimming with sharks", George Huang, 1994), já que os dois filmes trabalham com o mesmo tema. No último, o protagonista é um profissional recém-formado em cinema que deseja conseguir uma grande oportunidade de emprego e, em nome disso, se sujeita a ser assistente de uma grande “celebridade”: um famosíssimo produtor hollywoodiano que humilha a todos por considerar-se superior. Semelhantes, não? No caso deste último filme, porém, Kevin Spacey interpreta brilhantemente o produtor que, ao contrário de Miranda, consegue se tornar uma personagem complexa no desenvolver da trama. Parece-me o mesmo tema, no entanto, aqui é tratado de maneira séria (não porque é um drama em vez de comédia, e sim por ser bem feito) e respeitável.
É... Chego à conclusão de que O Diabo Veste Prada é um bom entretenimento para aqueles que se deixam seduzir pelo mundo da moda e das aparências, com direito até (que beleza!!!) a um happy end daqueles e, por mais incrível que possa parecer, um final moralizante.
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