As grandes coisas estão nas pequenas. A parte sempre revela o todo, com singular expressividade. Não há nada que seja tão banal, simples e “sem importância” o suficiente que não mereça a melhor de nossa atenção, pois lá é que as nossas “questões” se revelarão de maneira mais peculiar. Segundo a única perspectiva que realmente interessa – a “humana”, individual ou coletiva, isso não vem ao caso – as coisas mais desprezadas tornam-se as mais valiosas, porque significativas. O olhar míope da História, da Política ou de qualquer outra artimanha de segunda natureza que inventemos para justificar nossa cegueira somente faz por nos afastar das verdades mais essenciais. Assim, alguns limoeiros pode sim – e deve – ser o ponto mais importante dos conflitos entre israelenses e palestinos.
A alegoria, aqui, vai mais longe do que parece. Os limoeiros não apenas representam a terra, a etnia, a religião, a cultura em conflito; os limoeiros são a própria humanidade de uma mulher, sua história de vida, seus afetos, sua alma. Os limoeiros não são nada que diga respeito exclusiva e particularmente ao povo palestino, os limoeiros somos todos nós – inclusive os israelenses. Essa dimensão de sensibilidade nunca, nunca, jamais deve ser deixada de lado nas reflexões e debates sociais, políticos, históricos, econômicos, ou o diabo que o seja. Com o risco de repetirmos (mais uma vez) formas de barbárie cujos resultados já conhecemos bem demais. Eis o que de melhor pode ser destacado neste Lemon Tree (França / Alemanha / Israel, 2008, dir.: Eran Riklis).
A sensibilidade e o foco no pequeno, no particular, mas na medida apenas em que revelam o universal, são as ricas experiências que este filme pode nos proporcionar. O mais incrível – ou o mais lógico, por outro lado – é que o roteiro se baseia numa história real, o que serve para mostrar o quanto a vida e o mundo são repletos de coisas e de acontecimentos altamente significativos em sua “insignificância”, dotados naturalmente de incríveis potenciais estéticos, apenas a espera da atenção do artista. Ou de qualquer um de nós. A história é a de uma solitária viúva palestina, Salma Zidane, que vive a cuidar de um pomar de limoeiros herdados do seu falecido pai. Quando se muda para a propriedade do lado ninguém menos que o ministro da defesa de Israel, Israel Navon, o “inferno” da pobre senhora começa.
O ministro, apoiado pelo serviço secreto – ou vice-versa, isso pouco importa – dá a ordem para que se derrubem as árvores, uma vez que elas “poderiam” servir de esconderijo para terroristas. A Sra. Zidane não acata a decisão, e resolve trilhar uma verdadeira “via crucis” jurídica (com o perdão do trocadilho cristão) para tentar derrubar a “política territorial” do ministro, com a ajuda de um jovem e inexperiente advogado (também palestino). É a jornada solitária do “fraco” contra os “fortes”, embora a Sra. Zidane não estará tão sozinha assim: ela encontrará apoio de onde menos espera, mas também oposição. É um filme bem equilibrado, com narrativa e personagens bem consistentes, sem deixar perder a consistência dos temas e mensagens alegóricas trabalhados por esta parábola sensível.
O leitmotiv visual do filme são muros e cercas que separam, isolam as pessoas. É uma solução demasiado fácil para nossas dificuldades de convivência e aceitação do outro. Os limoeiros representam o poder de uma natureza que compõe um sistema orgânico com tudo e com todos. Todos precisamos de limões – inclusive o ministro de Israel, como se vê – assim como os limões precisam de todos nós; quero dizer, os limões não escolherão entre as mãos de um lavrador judeu ou árabe. A cegueira lúcida da natureza, mais uma vez, contra a lucidez cega de uma “civilização” sectária, dissociada, no final das contas moribunda. Através desse foco específico, o filme discute as coisas em uma dimensão totalizante. Só mesmo um espírito mesquinho (mas comum) para desdenhar da luta da Sra. Zidane com os seus limões, dando preferência a coisas mais “importantes”, quaisquer que sejam elas.
A alegoria, aqui, vai mais longe do que parece. Os limoeiros não apenas representam a terra, a etnia, a religião, a cultura em conflito; os limoeiros são a própria humanidade de uma mulher, sua história de vida, seus afetos, sua alma. Os limoeiros não são nada que diga respeito exclusiva e particularmente ao povo palestino, os limoeiros somos todos nós – inclusive os israelenses. Essa dimensão de sensibilidade nunca, nunca, jamais deve ser deixada de lado nas reflexões e debates sociais, políticos, históricos, econômicos, ou o diabo que o seja. Com o risco de repetirmos (mais uma vez) formas de barbárie cujos resultados já conhecemos bem demais. Eis o que de melhor pode ser destacado neste Lemon Tree (França / Alemanha / Israel, 2008, dir.: Eran Riklis).
A sensibilidade e o foco no pequeno, no particular, mas na medida apenas em que revelam o universal, são as ricas experiências que este filme pode nos proporcionar. O mais incrível – ou o mais lógico, por outro lado – é que o roteiro se baseia numa história real, o que serve para mostrar o quanto a vida e o mundo são repletos de coisas e de acontecimentos altamente significativos em sua “insignificância”, dotados naturalmente de incríveis potenciais estéticos, apenas a espera da atenção do artista. Ou de qualquer um de nós. A história é a de uma solitária viúva palestina, Salma Zidane, que vive a cuidar de um pomar de limoeiros herdados do seu falecido pai. Quando se muda para a propriedade do lado ninguém menos que o ministro da defesa de Israel, Israel Navon, o “inferno” da pobre senhora começa.
O ministro, apoiado pelo serviço secreto – ou vice-versa, isso pouco importa – dá a ordem para que se derrubem as árvores, uma vez que elas “poderiam” servir de esconderijo para terroristas. A Sra. Zidane não acata a decisão, e resolve trilhar uma verdadeira “via crucis” jurídica (com o perdão do trocadilho cristão) para tentar derrubar a “política territorial” do ministro, com a ajuda de um jovem e inexperiente advogado (também palestino). É a jornada solitária do “fraco” contra os “fortes”, embora a Sra. Zidane não estará tão sozinha assim: ela encontrará apoio de onde menos espera, mas também oposição. É um filme bem equilibrado, com narrativa e personagens bem consistentes, sem deixar perder a consistência dos temas e mensagens alegóricas trabalhados por esta parábola sensível.
O leitmotiv visual do filme são muros e cercas que separam, isolam as pessoas. É uma solução demasiado fácil para nossas dificuldades de convivência e aceitação do outro. Os limoeiros representam o poder de uma natureza que compõe um sistema orgânico com tudo e com todos. Todos precisamos de limões – inclusive o ministro de Israel, como se vê – assim como os limões precisam de todos nós; quero dizer, os limões não escolherão entre as mãos de um lavrador judeu ou árabe. A cegueira lúcida da natureza, mais uma vez, contra a lucidez cega de uma “civilização” sectária, dissociada, no final das contas moribunda. Através desse foco específico, o filme discute as coisas em uma dimensão totalizante. Só mesmo um espírito mesquinho (mas comum) para desdenhar da luta da Sra. Zidane com os seus limões, dando preferência a coisas mais “importantes”, quaisquer que sejam elas.
2 comentários:
André,
"Lemon tree" é isso mesmo: grande e universal por ser tão pequeno e particular. Gostei muito.
Abração
André,
Tudo bem?
Você leu a entrevista com o diretor, Eran Riklis, de Lemon Tree na Paisà?
Link: http://www.revistapaisa.com.br/agosto08/entriklis.htm
Qual a sua expectativa em relação ao filme La León, lançamento da Moviemobz? Eu gostei bastante. Remete a Malick e Bresson.
Um abraço.
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