A Hora e Vez de Augusto Matraga (Brasil, 1965, dir.: Roberto Santos) é uma adaptação digna da obra de João Guimarães Rosa. Mesmo o filme estando mais para o Cinema Novo do que para o “cosmo de mitos” (Alfredo Bosi) do autor de Sagarana. A dimensão épica do conto se revela com mais força apenas no final – o grande clímax – genuinamente apoteótico: dizem que o próprio Guimarães Rosa se orgulhava do filme, dizendo que o final tinha ficado melhor que o da história escrita. De qualquer modo, é uma fita dotada de sensibilidade poética: nas imagens, trilha sonora e, principalmente, no roteiro muito bem elaborado, cujos diálogos fluem muito bem pelas bocas de grandes e clássicos atores como Leonardo Villar (Augusto Matraga) e Jofre Soares (Joãozinho Bem-Bem).
Escrito por Gianfrancesco Guarnieri, o “script” aproveita muito bem a linguagem sertaneja e poética do escritor mineiro, e de um modo que não soa teatral ou artificial demais – apesar de a encenação de certos trechos lembrar muito algo do tipo Teatro Oficina (coisa do cinema dos anos 60). A história de Nhô Augusto, a última do volume Sagarana, é uma das mais míticas e transcendentes de Rosa. A trágica e epifânica jornada de Nhô Augusto é a própria jornada do herói: jornada de ascensão – queda – redenção – ascensão final, jornada dialética que mistura e resolve as grandes contradições do espírito humano: bem e mal, salvação e pecado, passado e presente (sem esquecer o futuro em vista).
Nhô Augusto atinge a síntese que todos nós tanto buscamos, a síntese entre todos os mais diferentes aspectos e impulsos do seu caráter, devidamente processados em função de uma missão de vida realmente significativa, missão essa que envolve o bem não apenas do indivíduo, mas também do outro – o coletivo. A jornada de abnegação de Nhô Augusto revela-se uma jornada (com a devida conquista) da grande realização pessoal. Enquanto se afirmava a si próprio, Nhô Augusto negava-se; passando a se negar, ele conquistou a verdadeira auto-afirmação.
É uma dialética complexa mesmo, mas que está presente em narrativas das mais diversas religiões, mitologias de povos distintos, e até mesmo em nossa indústria cultural: basta ver as histórias dos heróis em “Super-Homem”, “Star Wars”, “Matrix”, ou em “Os Imperdoáveis” de Clint Eastwood (principalmente neste último exemplo, guardadas as devidas variantes e proporções, naturalmente). Todo mundo tem a sua hora e vez. A nossa ainda há de chegar. Iremos para o céu nem que seja “a porrete”... Enfim, ainda não apareceu o filme que incorpore em sua própria linguagem a grandeza do conteúdo e da forma artística de Rosa.
As melhores tentativas ainda são muito tímidas, e fazem a escolha pelo caráter “regionalista” das narrativas (o menor dos aspectos que compõem a grande contribuição do escritor), daí o aspecto de Cinema Novo, neo-realista, que perdura até hoje nas adaptações: basta ver Mutum (2007) – inspirado pela novela Miguilim. No entanto, para expressar as altas ambições filosóficas, míticas e místicas do autor de “Grande Sertão: Veredas”, é preciso trabalhar com outros códigos cinematográficos, a partir de outras tradições. Por exemplo: que tal fazer um filme baseado na obra de Rosa inspirado pelo cinema de Carl Dreyer, Andrei Tarkovski, Akira Kurosawa, Francis Ford Coppola, etc? Ainda estamos esperando...
Escrito por Gianfrancesco Guarnieri, o “script” aproveita muito bem a linguagem sertaneja e poética do escritor mineiro, e de um modo que não soa teatral ou artificial demais – apesar de a encenação de certos trechos lembrar muito algo do tipo Teatro Oficina (coisa do cinema dos anos 60). A história de Nhô Augusto, a última do volume Sagarana, é uma das mais míticas e transcendentes de Rosa. A trágica e epifânica jornada de Nhô Augusto é a própria jornada do herói: jornada de ascensão – queda – redenção – ascensão final, jornada dialética que mistura e resolve as grandes contradições do espírito humano: bem e mal, salvação e pecado, passado e presente (sem esquecer o futuro em vista).
Nhô Augusto atinge a síntese que todos nós tanto buscamos, a síntese entre todos os mais diferentes aspectos e impulsos do seu caráter, devidamente processados em função de uma missão de vida realmente significativa, missão essa que envolve o bem não apenas do indivíduo, mas também do outro – o coletivo. A jornada de abnegação de Nhô Augusto revela-se uma jornada (com a devida conquista) da grande realização pessoal. Enquanto se afirmava a si próprio, Nhô Augusto negava-se; passando a se negar, ele conquistou a verdadeira auto-afirmação.
É uma dialética complexa mesmo, mas que está presente em narrativas das mais diversas religiões, mitologias de povos distintos, e até mesmo em nossa indústria cultural: basta ver as histórias dos heróis em “Super-Homem”, “Star Wars”, “Matrix”, ou em “Os Imperdoáveis” de Clint Eastwood (principalmente neste último exemplo, guardadas as devidas variantes e proporções, naturalmente). Todo mundo tem a sua hora e vez. A nossa ainda há de chegar. Iremos para o céu nem que seja “a porrete”... Enfim, ainda não apareceu o filme que incorpore em sua própria linguagem a grandeza do conteúdo e da forma artística de Rosa.
As melhores tentativas ainda são muito tímidas, e fazem a escolha pelo caráter “regionalista” das narrativas (o menor dos aspectos que compõem a grande contribuição do escritor), daí o aspecto de Cinema Novo, neo-realista, que perdura até hoje nas adaptações: basta ver Mutum (2007) – inspirado pela novela Miguilim. No entanto, para expressar as altas ambições filosóficas, míticas e místicas do autor de “Grande Sertão: Veredas”, é preciso trabalhar com outros códigos cinematográficos, a partir de outras tradições. Por exemplo: que tal fazer um filme baseado na obra de Rosa inspirado pelo cinema de Carl Dreyer, Andrei Tarkovski, Akira Kurosawa, Francis Ford Coppola, etc? Ainda estamos esperando...
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