Palavra (En)cantada é um documentário honesto, feito com inteligência e sensibilidade. Mesmo assim, não vai além do que se espera das cabeças bem-pensantes neste nosso Brasil contemporâneo: uma preocupação politicamente correta de se mostrar as diversas facetas do objeto em estudo, mas que não deixa de trair um ponto de vista central essencialmente elitista. Vejamos: o novo filme de Helena Solberg (que realizara Vida de Menina em 2004) discutirá as relações entre poesia e letra de música; ou melhor, o filme deixará que os próprios poetas, músicos e “especialistas” (professores universitários) discutam o assunto. Muito bem.
Começando com gente como Adriana Calcanhoto (que nos presenteou com uma bela “canja” envolvendo uma antiga cantiga provençal de Arnaut Daniel), Chico Buarque de Holanda, Arnaldo Antunes e os professores doutores músicos Luiz Tatit e José Miguel Wisnik (verdadeiros biscoitos finos), em um determinado momento da exibição eu já estava me remexendo inquieto na poltrona, na esperança do momento em que o filme finalmente começaria a falar da música popular brasileira de fato. Eis, então, que são chamados ao picadeiro os rappers Black Alien e Ferréz, B. Negão (o mais próximo do universo do funk carioca que este filme ousou chegar, ainda sim terrivelmente distante) e
Martinho da Vila; sem contar as cenas que mostram os desafios de rima e improviso empreendidos por cantadores repentistas e MC’s de rap – verdadeiros achados. Mesmo assim, considerando que do “outro lado” ainda há Tom Zé, Zélia Duncan, Lenine, José Celso Martinez Corrêa, Jorge Mautner e Lirinha (o Justin Timberlake das garotas universitárias, vocalista do Cordel do Fogo Encantado), concluímos que este filme acaba pendendo mais para as velhas (e sempre as mesmas) manifestações musicais do “bom gosto”, daquela “MPB” que sempre está na boca dos professores de português (e literatura) – mas nunca dos seus alunos.
O desequilíbrio não é tão forte assim, este pequeno e bom filme continua sendo bastante recomendável. Mas a diretora bem que poderia ter buscado beber um pouquinho a mais nas fontes realmente populares de nossa música; dizer que nelas não há poesia alguma, ou uma poesia de qualidade “inferior” seria o cúmulo de um absurdo que, não obstante, perpassa o discurso de muitos dos espectadores de um filme como este. Ora bolas, por que não entrevistar Paulo Coelho, co-autor de magníficas canções em parceria com Raul Seixas? Por que não pesquisar o forró “brega”, a música sertaneja “brega”, o pagode, os clássicos como Odair José, Nelson Gonçalves, Reginaldo Rossi, Roberto Carlos e Erasmo Carlos?
(Estes dois últimos são sofisticados mesmo, inclusive dentro dos padrões acadêmicos de “poesia”, conforme atestam pérolas do quilate de “Detalhes” e “As curvas da estrada de Santos” – quem tiver ouvidos para ouvir, que ouça). Por que não mergulhar mais a fundo no (sub)mundo do “pancadão”? Enfim, se a diretora tentou, mas não conseguiu (imagino que não seja lá muito fácil entrar em contato com Paulo Coelho e Roberto Carlos), tudo bem. Mas não podemos perdoar forma alguma de “vista grossa”, pois muita gente já faz isso demais por aí. Do outro lado, um compositor que lança um disco de “MPB” chamado “Pérolas aos poucos”, fazendo o tipo de música que ele faz, não merece ser levado a sério. Mas não interessa falar quem é. Quem quiser, que descubra.
Começando com gente como Adriana Calcanhoto (que nos presenteou com uma bela “canja” envolvendo uma antiga cantiga provençal de Arnaut Daniel), Chico Buarque de Holanda, Arnaldo Antunes e os professores doutores músicos Luiz Tatit e José Miguel Wisnik (verdadeiros biscoitos finos), em um determinado momento da exibição eu já estava me remexendo inquieto na poltrona, na esperança do momento em que o filme finalmente começaria a falar da música popular brasileira de fato. Eis, então, que são chamados ao picadeiro os rappers Black Alien e Ferréz, B. Negão (o mais próximo do universo do funk carioca que este filme ousou chegar, ainda sim terrivelmente distante) e
Martinho da Vila; sem contar as cenas que mostram os desafios de rima e improviso empreendidos por cantadores repentistas e MC’s de rap – verdadeiros achados. Mesmo assim, considerando que do “outro lado” ainda há Tom Zé, Zélia Duncan, Lenine, José Celso Martinez Corrêa, Jorge Mautner e Lirinha (o Justin Timberlake das garotas universitárias, vocalista do Cordel do Fogo Encantado), concluímos que este filme acaba pendendo mais para as velhas (e sempre as mesmas) manifestações musicais do “bom gosto”, daquela “MPB” que sempre está na boca dos professores de português (e literatura) – mas nunca dos seus alunos.
O desequilíbrio não é tão forte assim, este pequeno e bom filme continua sendo bastante recomendável. Mas a diretora bem que poderia ter buscado beber um pouquinho a mais nas fontes realmente populares de nossa música; dizer que nelas não há poesia alguma, ou uma poesia de qualidade “inferior” seria o cúmulo de um absurdo que, não obstante, perpassa o discurso de muitos dos espectadores de um filme como este. Ora bolas, por que não entrevistar Paulo Coelho, co-autor de magníficas canções em parceria com Raul Seixas? Por que não pesquisar o forró “brega”, a música sertaneja “brega”, o pagode, os clássicos como Odair José, Nelson Gonçalves, Reginaldo Rossi, Roberto Carlos e Erasmo Carlos?
(Estes dois últimos são sofisticados mesmo, inclusive dentro dos padrões acadêmicos de “poesia”, conforme atestam pérolas do quilate de “Detalhes” e “As curvas da estrada de Santos” – quem tiver ouvidos para ouvir, que ouça). Por que não mergulhar mais a fundo no (sub)mundo do “pancadão”? Enfim, se a diretora tentou, mas não conseguiu (imagino que não seja lá muito fácil entrar em contato com Paulo Coelho e Roberto Carlos), tudo bem. Mas não podemos perdoar forma alguma de “vista grossa”, pois muita gente já faz isso demais por aí. Do outro lado, um compositor que lança um disco de “MPB” chamado “Pérolas aos poucos”, fazendo o tipo de música que ele faz, não merece ser levado a sério. Mas não interessa falar quem é. Quem quiser, que descubra.
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