Entre os Muros da Escola (“Entre Les Murs”, França, 2008, dir.: Laurent Cantet) faz a demonstração de um problema que está sempre presente nos debates educacionais: a separação (não apenas pedagógica) entre a instituição escola e a sociedade. O ganhador da palma de ouro de Cannes em 2008 é animado por uma força vertiginosamente centrípeta: vemos aí o universo escolar (e mais particularmente o micro-universo da sala de aula) como se constituísse a totalidade da existência. Toda a ação do filme se passa dentro da escola, exceto a cena inicial que, muito a propósito, mostra o professor protagonista dirigindo-se para o seu local de trabalho. A partir de então, o ambiente escolar será mostrado como um espaço fechado, isolado, estanque, independente. Neste aspecto, o título é altamente sugestivo.
“Entre os muros”: a escola é mostrada como uma prisão (as cenas que mostram os alunos no pátio durante o recreio comprova a conotação), como um espaço de claustrofobia, não apenas no sentido físico, mas também no simbólico. A mise en scène trabalha bem a favor: a maior parte do filme compõe-se de planos próximos, com aquela câmera “na mão” que evoca uma atmosfera documental e ao mesmo tempo intimista. Desse cinema centrípeto, realizado como teatro, depreende-se então o grande drama da educação no formato escolar dos nossos tempos: a escola não interfere (não mais) no mundo; mas o mundo continua interferindo (e cada vez mais) na escola. Por mais que a instituição tente se blindar das vicissitudes sociais, estas arranjam sempre alguma maneira de furar a barragem.
Como exemplo, temos os dramas dos alunos imigrantes (africanos e asiáticos) e as relações de poder entre professores (e diretoria) e estudantes. Considerando-se que a situação real de uma sala de aula (que o filme mostra muito detalhadamente, em cenas bem longas) envolve uma relação (ou conflito) entre personalidades e grupos sociais dos mais díspares, e que – não obstante os fatos – as políticas educacionais em relação às escolas ainda se moldam com surpreendente dogmatismo em valores “iluministas”, o que é que os professores poderão fazer? “Educar” os alunos à custa da realidade (como se faz no filme) ou abandonar o trabalho (como tenta fazer um dos docentes, esgotado até a alma, numa cena de grande impacto)?
Eis a natureza dos impasses que esta fita evoca com sutileza mas com grande força latente. Que não se espere ver em “Entre Les Murs” uma parábola edificante como os clássicos filmes “de professor” – talvez o mais emblemático deles seja Ao Mestre com Carinho (“To Sir With Love”, EUA, 1967, dir.: James Clavell). A função do filme aqui é problematizar; porém, sem qualquer pretensão científica ou ideológica – o que é o melhor. “Entre Les Murs” apresenta-se como uma simples descrição (sequer narração) do cotidiano de trabalho de um professor e uma de suas turmas, numa espécie de neo-realismo jornalístico – ou de “reality show”. O foco está nas vivências das pessoas e nas relações entre elas, com todas as complicadas implicações aí envolvidas. Quando se pensa em educação, dificilmente se pensa (de verdade) nos seus agentes mais importantes: professores e alunos. Mas aí está o exemplo.
“Entre os muros”: a escola é mostrada como uma prisão (as cenas que mostram os alunos no pátio durante o recreio comprova a conotação), como um espaço de claustrofobia, não apenas no sentido físico, mas também no simbólico. A mise en scène trabalha bem a favor: a maior parte do filme compõe-se de planos próximos, com aquela câmera “na mão” que evoca uma atmosfera documental e ao mesmo tempo intimista. Desse cinema centrípeto, realizado como teatro, depreende-se então o grande drama da educação no formato escolar dos nossos tempos: a escola não interfere (não mais) no mundo; mas o mundo continua interferindo (e cada vez mais) na escola. Por mais que a instituição tente se blindar das vicissitudes sociais, estas arranjam sempre alguma maneira de furar a barragem.
Como exemplo, temos os dramas dos alunos imigrantes (africanos e asiáticos) e as relações de poder entre professores (e diretoria) e estudantes. Considerando-se que a situação real de uma sala de aula (que o filme mostra muito detalhadamente, em cenas bem longas) envolve uma relação (ou conflito) entre personalidades e grupos sociais dos mais díspares, e que – não obstante os fatos – as políticas educacionais em relação às escolas ainda se moldam com surpreendente dogmatismo em valores “iluministas”, o que é que os professores poderão fazer? “Educar” os alunos à custa da realidade (como se faz no filme) ou abandonar o trabalho (como tenta fazer um dos docentes, esgotado até a alma, numa cena de grande impacto)?
Eis a natureza dos impasses que esta fita evoca com sutileza mas com grande força latente. Que não se espere ver em “Entre Les Murs” uma parábola edificante como os clássicos filmes “de professor” – talvez o mais emblemático deles seja Ao Mestre com Carinho (“To Sir With Love”, EUA, 1967, dir.: James Clavell). A função do filme aqui é problematizar; porém, sem qualquer pretensão científica ou ideológica – o que é o melhor. “Entre Les Murs” apresenta-se como uma simples descrição (sequer narração) do cotidiano de trabalho de um professor e uma de suas turmas, numa espécie de neo-realismo jornalístico – ou de “reality show”. O foco está nas vivências das pessoas e nas relações entre elas, com todas as complicadas implicações aí envolvidas. Quando se pensa em educação, dificilmente se pensa (de verdade) nos seus agentes mais importantes: professores e alunos. Mas aí está o exemplo.
3 comentários:
Ótimo texto. Mais um motivo para procurar este filme...
Ciao!
Há tempos que não via tamanha competência no realismo cinematográfico. A câmera de Cantet é discreta o suficiente para criar o efeito de que estamos lá, parece que estamos assistindo à aula. E o professor não é um herói idealista que quer salvar as vidas de seus alunos problemáticos, como já vimos em alguns filmes americanos. Você foi certeiro ao dizer que é uma simples descrição. O filme é triste mas também tem momentos de humor ou de alegria, assim como a própria escola. Obra de arte.
Falou muito bem, Ivan! Mas, ainda assim, meu gosto pessoal vai para fitas como "Escola do Rock" e "Curso de Verão"...
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