domingo, outubro 19, 2008

O Poderoso Chefão


Filme exibido na 32ª Mostra de Cinema de São Paulo.

Por mais que Walter Benjamin já tenha falado da perda da aura da obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica, a experiência de assistir a uma cópia restaurada de O Poderoso Chefão (“The Godfather”, EUA, 1972, dir.: Francis Ford Coppola), no cinema, mantém algo do maravilhoso de se ver uma obra prima em toda a força presente de sua materialidade. Poucas vezes se terá a oportunidade de vivenciar e compreender a experiência do Cinema, de um ponto de vista fenomenológico. Não importa quantas vezes já se tenha assistido a esse filme, o quanto que já se conheça de cor e salteado todos os detalhes da história, o espectador sempre ficará tenso em sua cadeira, tomará sustos, surpreendendo-se com o conhecido tanto quanto com aspectos jamais percebidos (eis a grande dimensão da obra prima).

Cada (re)visão será uma (re)descoberta. E não estamos falando apenas do que aparece na tela. Parte importante da vivência de se ver tal película na tela grande da sala escura será a comoção coletiva que ela provoca. A aura também está no público. Assistir a “The Godfather” numa sala cheia, em 2008, é uma verdadeira celebração. Obviamente, a maior parte desse público será de gente que já conhece e idolatra a obra. A atmosfera que se respira antes, durante e depois da exibição é algo inspirador e revigorante, como deviam ser os cultos das antigas religiões pagãs (poéticas e míticas a um só tempo). O Poderoso Chefão é poético e mítico, épico e lírico, sem abandonar as asas históricas e sociológicas. Eis a versatilidade dos grandes filmes, da grande arte.

Que se mantenha sempre viva essa dimensão do cinema enquanto celebração coletiva de uma obra de arte que, por mais reproduzida que seja, em cada ocasião e em cada lugar ela se fará única, como que apresentada pela primeira vez (mesmo que para pessoas que já a testemunharam incontáveis vezes, eis a questão). Nada muito diferente da consagração de um simples pedaço de pão em eucaristia, e sua conseqüente comunhão por todos os fiéis. Para que toda vez se relembre – e se reviva – o que jamais deve ser esquecido. E este cinema – experiência epifânica – deve sempre influenciar as novas produções. Não merecerá jamais ser levado a sério um diretor que não tenha como ideal, ou como perspectiva, o cinema de Coppola.

Não estou sendo classicizante. A questão é: mesmo que seja para destruir os padrões do cinema dito clássico e instaurar paradigmas completamente novos, deverá se conhecer e se ter em vista as melhores realizações de um cinema “conservador”. Para quê? Para que se saiba como fazer melhor, superar os mestres. Como disse Manuel Bandeira a um jovem poeta, é preciso saber compor sonetos decassílabos antes que se disponha a empreender versos livres. Mas como são raros os cineastas contemporâneos que parecem possuir em sua bagagem o cinema mais “antigo”! Não é à toa que um filme como Onde Os Fracos Não Têm Vez (2008, Joel e Ethan Coen) causará tanta (e tão positiva) surpresa. Que jovem (ainda mais nos EUA) terá paciência e disciplina para fazer verdadeiras óperas como “The Godfather”?

Um comentário:

Anônimo disse...

MARAVILHOSO. Sem palavras. Nada faz jus. Comprei a nova edição, aquela do diretor. Magnífica, faz jus á todos os três filmes.

Ciao!