sábado, abril 19, 2008

Jumper


Jumper (EUA, 2008, dir.: Doug Liman) é um filme despretensioso. Mesmo assim, suas premissas fazem o amante da Sétima Arte sonhar com um outro filme. Toda uma escola da realização e da teoria do Cinema defende a montagem como sendo o “específico cinematográfico”. Se pensarmos um pouco mais a fundo nas técnicas de edição, concluiremos que os seus atributos são os do teletransporte, que é exatamente o poder do protagonista de “Pulador”. A montagem serve para eliminar os tempos mortos da narrativa – não é à toa que ela está na base tanto do cinema de Hollywood quanto na escola soviética dos anos 20 (embora pensada e realizada de maneiras diferentes).

Em Jumper, tal montagem chega ao paroxismo, a ponto de a crítica reclamar – inutilmente – da superficialidade do enredo e das personagens; é óbvio que neste filme tudo é superficial, seu protagonista não tem a paciência para caminhar (literalmente ou não) de um lugar para outro, a própria montagem e o roteiro confirmam e expressam coerentemente essa idéia. Eis a proposta da fita. O personagem de Hayden Christensen (David Rice) é aquele típico “kidult” hiper-ativo e preguiçoso ao mesmo tempo, pragmático ao extremo, sem a proverbial paciência para apreciar e aprender com a beleza do caminho, independentemente do ponto de chegada.

Mas não são esses mesmos os valores da sociedade de consumo do mundo “globalizado”? New York, Londres, Egito, Roma, tanto faz, é tudo igual mesmo, observa-se o pouco de cada lugar e vai-se embora para o próximo. É a futilidade blasé dos “playboys” do nosso tempo. A crítica também reclamou do visual excessivamente “cartão postal” de cada lugar, mas não é essa a proposta do filme, a visão de mundo por ele representada? (se representada conscientemente ou não, isso pouco importa aqui). David não faz nada além do que a sociedade contemporânea espera dele, inclusive deleitar-se infantilmente e corromper-se com o poder que tem em mãos.

Assim é David Rice. Assim é o filme que o representa. Assim é o espectador desse filme (ou de filmes “assim”). A ultra-velocidade tão elogiada da vida contemporânea é a marca de Jumper. Agora, o filme não ironiza, não destrói “por dentro” esses códigos – eis a primeira razão pela qual o cinéfilo poderia sonhar com outro filme; quem sabe se ele tivesse sido realizado pelo diretor de Scanners (1981)... A segunda razão está em que, mesmo “concordando” com essa forma de cinema e de mundo, o diretor Doug Liman poderia ter usado mais criativamente a montagem para expressar tais idéias, meditando mais sobre a montagem enquanto “teleporte” cinematográfico e buscando maneiras mais experimentais, digamos assim, para associar poeticamente as escolhas do personagem com as escolhas do próprio filme.

Para isso, mesmo com todo o ritmo dinâmico da película (88 minutos de duração só), teria sido bem (mais) interessante se o diretor procurasse, de alguma maneira, realizar em Jumper o conceito da geografia criativa de Lev Kulechov – mestre soviético da montagem como construtora de significados. Ele propõe que se junte o plano de um homem que caminha em Manhattan – tendo a Estátua da Liberdade ao fundo – com o de uma mulher caminhando em Paris ao encontro desse homem – tendo a Torre Eiffel ao fundo. Então, num terceiro plano, ambos se encontram, só que em Roma – o Coliseu ao fundo. Ismail Xavier afirma que a geografia criativa “corresponde justamente ao processo pelo qual a montagem confere um efeito de contigüidade espacial a imagens obtidas em espaços completamente distantes, e de aparência de realidade a um todo irreal” (O Discurso Cinematográfico – a Opacidade e a Transparência).

Bem, essa é uma bola que Doug Liman chuta na trave. O insólito de algumas imagens até que é bem interessante: o “jumper” sentado numa cadeira de praia no topo da cabeça da esfinge no Egito, o tradicional ônibus de dois andares londrino indo parar no meio do deserto do Saara. Mas comete um grave pecado cinematográfico: dizer com palavras o que poderia ser dito com imagens: eis a descrição que David faz, logo no começo, de uma típica manhã sua. Enfim, entre Heroes, X-Men e A Identidade Bourne (do próprio Liman) teleporta-se esse Jumper, com a agilidade própria do personagem, mas provocando, assim como ele, estragos por onde passa.

Um comentário:

Débora Hégedus disse...

Putz... assisti essa "peça" ontem... achei "engraçadinho mas ordinário" kkkkkk

Queria taaaanto ser ele... acho q é a única coisa q o filme acerta... cutucar esse desejo da gente por andar pelo mundo todo e fazer o q quiser.. :)

Sobre a poesia, acho q sou apenas eu e não aquele monte de gente... rsrs