Nós não engolimos mais os heróis no sentido clássico do termo, feliz ou infelizmente. Assim, neste mundo desmitologizado, Hancock aparece como mais uma das cada vez mais freqüentes versões para o cinema contemporâneo do herói pós-moderno, humano, demasiado humano. Anti-herói? Que seja. Mas Hancock (EUA, 2008,dir.: Peter Berg) trabalha com a tal “pós-modernidade” do herói de maneira mais rica do que muitas das produções que tentam pegar algo da cultura pop e lhe dar ares mais inteligentes, des-construtivos. Boa parte da diferenciação criativa de Hancock responde pelo nome de Will Smith. Esta é mais uma fita-vitrine para o ator, o que não é nada mal, pois Smith é perfeitamente dotado do que se exige para segurar um filme inteiro nas costas, e, além do mais, as produções para as quais ele nos dá o ar da sua graça são bastante dignas de respeito.
Alguém disse que o grande ator de cinema é bem diferente do grande ator de teatro. Enquanto este brinca com toda a versatilidade da arte de atuar, aquele “nada mais faz” do que encarnar e vivenciar um tipo – muitas vezes representando a sua própria personalidade. Dar estilo ao caráter, como disse Nietzche. Sendo assim, creiamos que os dois maiores gênios da atuação “carismática” na Hollywood de hoje são Will Smith e Johnny Depp (imagine um filme reunindo os dois). Hancock é um filme altamente estiloso – o que também pode se explicar (ou especular) levando-se em conta que um dos produtores (e quase diretor, segundo o “making of”) é ninguém menos que Michael Mann. O filme – assim como Smith – possui aquele charme arrebatador e espontâneo (aparentemente). Não se trata de nada humilde, mas nada de mão pesada (ou cabeça, ou coração), por outro lado.
Desconstrução dos mitos, ironia, anti-heroísmo, pós-modernidade (as tão polêmicas questões de identidade), um certo niilismo, tudo isso casa muito bem no filme com explosões, batalhas épicas, efeitos em computação gráfica. Mas não nos esqueçamos que Hancock não empreende nenhuma iconoclastia. O fundo do filme é bem assentado em velhos princípios (apesar de estes aparecerem particularmente banalizados e simplificados demais no final, contrariando com isso o tom geral da narrativa, mais aberta e complexa – enfim, alguma concessão há de se fazer numa superprodução). Tais princípios mantém o valor do mito heróico, no sentido clássico mesmo. O herói como espécime de uma raça de “deuses”, deliciosamente incoerente no que mistura em si o melhor (e além) e o pior (mas nunca aquém) de qualquer ser humano.
Mas isso já não é novidade nenhuma – basta consultar a velha (quase três mil anos) “Ilíada” de Homero. O interessante é misturar isso às linguagens, códigos e ideologias da sociedade (pós) moderna de consumo, afogada nas mais demiúrgicas formas da indústria cultural. Imagine ver um vídeo caseiro de Hércules ou Aquiles no Youtube. Eis o tom de Hancock. Não necessitamos mais do poeta-profeta vidente dos tempos míticos que, com o poder de sua assombrosa memória, nos relate – com a óbvia ajuda das musas – as façanhas de deuses e heróis. Temos a inteligência diabólica da máquina: cinema, internet. Nas palavras de Charlize Theron, super-heróis são apenas o nome mais recente para os sempre mesmos mitos. É na recriação criativa – sem subserviência, mas também sem excessivas desmitificações – de velhas tradições (incluindo a nova tradição velha dos filmes ou gibis de super-heróis) que Hancock retira sua força.
Alguém disse que o grande ator de cinema é bem diferente do grande ator de teatro. Enquanto este brinca com toda a versatilidade da arte de atuar, aquele “nada mais faz” do que encarnar e vivenciar um tipo – muitas vezes representando a sua própria personalidade. Dar estilo ao caráter, como disse Nietzche. Sendo assim, creiamos que os dois maiores gênios da atuação “carismática” na Hollywood de hoje são Will Smith e Johnny Depp (imagine um filme reunindo os dois). Hancock é um filme altamente estiloso – o que também pode se explicar (ou especular) levando-se em conta que um dos produtores (e quase diretor, segundo o “making of”) é ninguém menos que Michael Mann. O filme – assim como Smith – possui aquele charme arrebatador e espontâneo (aparentemente). Não se trata de nada humilde, mas nada de mão pesada (ou cabeça, ou coração), por outro lado.
Desconstrução dos mitos, ironia, anti-heroísmo, pós-modernidade (as tão polêmicas questões de identidade), um certo niilismo, tudo isso casa muito bem no filme com explosões, batalhas épicas, efeitos em computação gráfica. Mas não nos esqueçamos que Hancock não empreende nenhuma iconoclastia. O fundo do filme é bem assentado em velhos princípios (apesar de estes aparecerem particularmente banalizados e simplificados demais no final, contrariando com isso o tom geral da narrativa, mais aberta e complexa – enfim, alguma concessão há de se fazer numa superprodução). Tais princípios mantém o valor do mito heróico, no sentido clássico mesmo. O herói como espécime de uma raça de “deuses”, deliciosamente incoerente no que mistura em si o melhor (e além) e o pior (mas nunca aquém) de qualquer ser humano.
Mas isso já não é novidade nenhuma – basta consultar a velha (quase três mil anos) “Ilíada” de Homero. O interessante é misturar isso às linguagens, códigos e ideologias da sociedade (pós) moderna de consumo, afogada nas mais demiúrgicas formas da indústria cultural. Imagine ver um vídeo caseiro de Hércules ou Aquiles no Youtube. Eis o tom de Hancock. Não necessitamos mais do poeta-profeta vidente dos tempos míticos que, com o poder de sua assombrosa memória, nos relate – com a óbvia ajuda das musas – as façanhas de deuses e heróis. Temos a inteligência diabólica da máquina: cinema, internet. Nas palavras de Charlize Theron, super-heróis são apenas o nome mais recente para os sempre mesmos mitos. É na recriação criativa – sem subserviência, mas também sem excessivas desmitificações – de velhas tradições (incluindo a nova tradição velha dos filmes ou gibis de super-heróis) que Hancock retira sua força.
2 comentários:
É complicado gostar de "Hancock", ainda mais sabendo que era para ser um filme barra pesada, sobre herói que além de não querer ser herói, caçava um casal enquanto matava suas fãs com suas super-ejaculação - por isso preferiria mulheres à beira da morte.
Mas eu consegui me identificar com esse produto final, muito pelo carisma de Smith, não há como negar, mas é um filme de qualidades.
Eu gostei do filme porque tem uma proposta diferente do padrão.
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