domingo, maio 24, 2009

Star Trek


Preciso confessar: sou trekker inveterado. Mas a série de Gene Roddenberry é, para mim, algo tão íntimo que não costumo ficar falando muito dela por aí. Não obstante, algo precisa ser dito, agora que uma das mentes insanas por trás de Lost (J. J. Abrams, cuja série constitui algo ainda mais subjetivo para quem traça estas linhas) resolveu se meter com o legado de Roddenberry.

Em primeiro lugar, não sou daqueles fãs de Star Trek (que em tempos mais lusófonos era conhecida como “Jornada nas Estrelas”) que se arrepiam todos com as especificações técnicas da sala de teletransporte da nave Enterprise. No imaginário de Gene, a física é o de menos. É sempre bom (re)lembrar que o teletransporte na série clássica (1967-1969) não passou de uma “solução” para a inviabilidade orçamentária de se filmar uma nave descendo num planeta qualquer todas as semanas.

O ponto nevrálgico nas aventuras originais de capitão Kirk e companhia é a psicologia, a sociologia, a filosofia; em uma palavra: a mitologia. Em minha humilde opinião (sei que muitos trekkies discordarão), o episódio que talvez melhor encarne o espírito da série é o Lamento por Adonis (“Who Mourns for Adonis?”, exibido em 1967). Já o discuti neste blog, em fevereiro deste ano (“A space odissey where no man hás gone before”), traçando um paralelo com o 2001 de Stanley Kubrick.

Pois bem. É justamente este lado mitológico que foi deixado de lado por J. J. Abrams (tão presente, contudo, em Lost; ainda mais no final desta quinta temporada – para quem viu). A não ser que pensemos no simples mito do herói individual, idiossincrático, em constante embate contra todas as forças do meio; em suma: um herói romântico. Neste ponto, a Star Trek de Abrams está mais para a Star Wars de Lucas. Há uma cena do filme em que só falta o velho Sr. Spock dizer para o jovem Jim Kirk: “May the force be with you”.

Gene Roddenberry não faz epopéia romântica. A sua épica é clássica, homérica mesmo. Kirk e os outros personagens, apesar de suas maravilhosas idiossincrasias (tão bem mimetizadas pelos atores do filme de Abrams, o que pareceu ser a meta primordial desta obra), são apenas os porta-vozes, as encarnações míticas (eis o herói clássico) dos valores de uma coletividade.

No caso, uma humanidade utópica que já superou todas as mazelas sociais e parte agora na grande aventura da descoberta, indo aonde nenhum homem jamais esteve. É claro que a maior parte dos episódios são alegóricos: parábolas que dialogam com a nossa mesma sociedade tão problemática.

Infelizmente, estão ausentes desta novíssima produção os temas tão polêmicos que sempre animaram todas as séries que se desenvolveram sob a franquia Star Trek (política, ética, preconceito, intolerância, utopia, religião) e também os filmes (dos quais o melhor sempre será o Jornada nas Estrelas IV: A Volta para Casa, de 1986).

O filme de Abrams não deixa de ser “fascinating” (no bordão do impagável Spock), muito divertido, com efeitos especiais que realizam as fantasias de qualquer fã, e personagens muito bem trabalhados. Mas convenhamos: é um pouco infantil (o que nos remete, de novo, a George Lucas). Cadê a contracultura de Roddenberry? Do jeito que está, o novo “Star Trek” é perfeito para ser usado naquelas palestras escabrosas de treinamento empresarial.

2 comentários:

Wally disse...

Bem, gostei bem mais. Mas nunca vi a série e não sou um trekker. Comecei a ver os 11 filmes agora, e to gostando bastante.

Ciao!

André Renato disse...

Veja todos! E a série também...