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sábado, abril 12, 2008

Nação Fast Food


É mais uma dessas cartilhas sociológicas do cinema globalizado que os professores de atualidades do Ensino Médio adorarão passar aos seus alunos e promover aquele debate... O pior desses filmes é Babel (2006, Alejandro González Iñárritu); no extremo oposto fica O Senhor das Armas (“Lord of War”, 2005, Andrew Niccol). Quanto a este Nação Fast Food (“Fast Food Nation”, 2006, Richard Linklater), é um meio termo bastante razoável. Acompanhando paralelamente as histórias de várias personagens ligadas à indústria da “fast food”: um alto executivo da companhia, alguns adolescentes que trabalham nas lanchonetes e um grupo de imigrantes ilegais mexicanos que têm lá a sua função no abatedouro do qual sai a carne para os hambúrgueres, o filme vai construindo a sua tese.

Mas quem pensar que a tese aqui possui algo de manifesto – como nos documentários de Michael Moore, por exemplo – sairá bastante desiludido. O filme é bem negativista: quer dizer, descortina-se o pútrido espetáculo da indústria, mas derruba-se também qualquer possibilidade de reação objetiva e eficaz contra ele. Pois tal reação só poderia partir de indivíduos isolados, com pouco poder de informação para enfrentar sabiamente a onipotente, onipresente e onisciente máquina da corporação. Como diz a personagem de Bruce Willis, a ponta estelar no meio do elenco carimbado do cinema independente norte-americano: “We all have to eat a little shit from time to time” (“Todos temos que comer um pouco de merda de vez em quando”). Lembremos que a intriga central, que pouco importará afinal de contas, gira em torno das denúncias de excesso de coliformes fecais nos hambúrgueres.

Linklater (“O Homem Duplo”, “Escola de Rock”, “Antes do Amanhecer”) e o roteirista Eric Schlosser (que adapta o seu próprio livro: “País Fast Food – O Lado Nocivo da Comida Norte-Americana”) ironizam muito sarcasticamente o idealismo pueril dos adolescentes “engajados”: é literalmente ridícula a tentativa deles em “libertar” o gado. A cena da garota ex-“mac-escrava” olhando toda preocupada nos olhos das vacas e dizendo daquele jeito bem de menina: “Don’t you wanna be freeeee?” (“Vocês não querem ser livres?) é altamente patética. Impagável. A frustração deles só é comparável à sua ignorância e incompetência. Aliás, o sarcasmo já nasce do mero fato da “rock star” Avril Lavrigne ser escalada como uma jovem “revolucionária”. Assim, já se pode ver que Nação Fast Food está nos antípodas da retórica “Michael Moore”.

Contudo, a tese acaba pesando mais do que o drama das personagens, infelizmente – como é comum nesses filmes. Neste caso, a constante variação de núcleos narrativos acaba cansando. O filme também acaba se desequilibrando na atenção exagerada que deu à participação de Ethan Hawke (ator amigo de Linklater), embora sua presença tenha se mostrado significativa. Mas há um mérito cinematográfico em tudo isso: Richard Linklater soube ver e mostrar o aspecto abjeto, a aparência não-comestível das coisas que compõem o cardápio das “fast foods”, da primeira à última imagem do filme. Logo na abertura, a câmera dá um travelling tão próximo em cima de uma carne de hambúrguer frita, que ela adquire o caráter de alguma coisa nojenta qualquer – que poderia ser tanto carne, quanto fezes, quanto terra. Essas mesmas carnes, congeladas, saindo da linha de produção, parecem qualquer coisa, menos algo “de comer”. Finalmente, o gado sendo abatido, desmembrado, escalpelado, sangrado, fatiado e separado de suas vísceras “não-comestíveis”, fará a alegria dos ativistas vegetarianos.

2 comentários:

  1. Filme mediano, mas com o que dizer, e cuja mensagem vem explícita demais. Ao contrário do que você disse, vejo o filme como se Michael Moore passasse aos filmes de ficção, só que sem seu sarcasmo. Ainda sim um bom programa.

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  2. Entendo o que você quer dizer. É mediano mesmo, mas mesmo assim, vale a pena por entrar nesses assuntos "cabeludos"...

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